Esta semana foi marcada pela formalização do pedido de saída do Reino Unido da União Europeia (UE). Com um tom marcadamente anglófobo, a generalidade dos meios de Comunicação Social portugueses procuraram inculcar-nos a mensagem central de Donald Tusk: os restantes 27 países estão mais unidos do que nunca no seu compromisso com a integração europeia. O que vale esta afirmação, quando o rumo da UE é marcado por profundas contradições e por um acumular de problemas sem resoluções à vista, no que se refere a elevadas taxas de desemprego (em particular dos jovens), à situação dos refugiados, a retrocessos sociais e a fundamentadas desconfianças nos políticos?
Não se pode nem deve esconder a importância da saída do Reino Unido, a segunda maior economia europeia e um país com grande importância geoestratégica no plano europeu e mundial. Sendo certo que os precedentes que se criarem marcarão muito o futuro da UE, não há forma de os camuflar e ignorá-los seria desastroso.
À medida que o processo de integração avança, escamoteando os bloqueios à democracia, e que a UE se mostra incapaz de resolver os obstáculos criados com a crise financeira, nomeadamente no que ao euro diz respeito, as tensões políticas vão-se acumulando por todo o espaço europeu.
Exemplo maior destas tensões é o problema bancário que se manifesta em países como Itália ou Portugal. De facto temos assistido, nestes dias, a mais um episódio da ingerência europeia, num ato de gestão política que subjuga os legítimos interesses dos portugueses às práticas predadoras dos "mercados". Sob pressão de Bruxelas, o Governo (terá remado forte contra a maré?) vende a preço de saldo um dos maiores bancos portugueses a um fundo "abutre", o Lone Star, grupo especializado em comprar barato e vender caro, mas jamais vocacionado para efetivas reorganizações da Banca. Bruxelas "permite" ao Estado uma participação de 25% no capital do banco, mas sem real direito a voto na condução do negócio. O Estado subsidia a privatização do Novo Banco - na realidade é uma ajuda de Estado ao Lone Star - quer através da participação no capital, quer das garantias que terá de assegurar. Tudo isto, a pretexto da proibição europeia de "ajudas de Estado", o que só pode parecer uma piada de mau gosto, depois de anos de apoio público à Banca promovido pela própria UE.
A pressionada venda do Novo Banco ao fundo "abutre", deve ser entendida como passo intermédio na transferência dos ativos deste banco para um qualquer grande banco europeu. Este é o programa das instituições europeias: criação de conglomerados financeiros europeus. Para promover tal agenda, servem-se das situações de crise nos países. Em Portugal, a execução deste objetivo já tinha sido adotada aquando da venda do Banif ao Santander.
Continua assim por resolver um dos maiores bloqueios da economia nacional. Temos um setor bancário com problemas recorrentes, incapaz de alavancar o investimento produtivo, o que é muito grave, pois sem ele não há criação de emprego com qualidade, nem bases sólidas para o desenvolvimento do país. Devemos preocupar-nos quando vemos a Banca voltar a um modelo de negócio que já deu maus resultados: o crédito imobiliário e o crédito ao consumo concedido às famílias. Prova desse rumo é o retorno da publicidade agressiva dirigida a estes segmentos de mercado, já presente nos grandes meios da Comunicação Social.
A crise que vivemos depois de 2008 pôs termo a um modelo que compensava a desvalorização salarial com facilidades de acesso ao crédito. Fomos empurrados para essa armadilha e depois acusados de "andar a viver acima das nossas possibilidades". Tomemos cautelas para não cairmos nesse logro uma segunda vez.
O país precisa de debates sérios sobre os problemas da dívida e do euro, pois situam-se aí grandes obstáculos ao investimento e ao desenvolvimento e será com a sua discussão que poderemos reajustar melhor a nossa estratégia na UE. Será um desastre recolocar o endividamento como motor da procura. A procura necessita de um bom estímulo, mas ancorado na valorização do trabalho e dos setores produtivos.