De 16 a 20 de Junho, realizou-se em Cartagena de Índias (Colômbia) o Fórum Social Mundial Temático (FSMT) sobre Democracia, Direitos Humanos, Guerra e Narcotráfico. Tal como os foros nacionais, de que o último foi o Fórum Social Português, e os foros regionais, de que o próximo será o segundo Fórum Social Europeu, este foro temático foi convocado pelo Conselho Internacional do Fórum Social Mundial. Enquanto os foros nacionais e regionais visam discutir temas que especificamente dizem respeito a um país ou a uma região, os foros temáticos são foros mundiais, mas, ao contrário dos foros sociais mundiais de âmbito geral, centram-se no debate de um tema específico e na elaboração de propostas globais que a ele respeitem. Procura-se sempre que o tema, ainda que de âmbito global, se realize num país ou cidade em que assuma especial significado.
Tal como o FSMT Pan-Amazónico, sobre os problemas da Amazónia se realizou em Belém, no Brasil, este FSMT realizou-se na Colômbia, um país a viver uma guerra interna, hoje muito dependente da política proibicionista das drogas imposta pelos EUA, onde as violações dos direitos humanos são massivas e a democracia, uma vivência política de baixíssima intensidade. É o país do mundo com a taxa mais alta de homicídio, onde morrem anualmente mais líderes sindicais e comunitários, e onde muitas centenas de vereadores municipais, ameaçados de morte, são obrigados a deslocar-se para outros municípios, donde, quase clandestinamente, vão despachando pelo telefone sobre as áreas da sua competência.
Participaram neste fórum 4.900 delegados vindos de 30 países, sendo que a esmagadora maioria veio da Colômbia. Pretendeu-se que o tema da democracia servisse de pano de fundo à discussão de todos os outros temas e coube-me o privilégio de fazer a palestra inaugural sobre esse tema. À semelhança do que sucedera no Fórum Social Português, abordei o tema das relações entre a democracia representativa e a democracia participativa: a necessidade de fortalecer a primeira assente nos partidos e no voto, com a segunda, assente na participação dos cidadãos, individualmente ou organizados em movimentos e associações, através de referendos, iniciativas cidadãs, conselhos de utentes de serviços públicos, consultas, debates públicos, gestão municipal participativa, orçamentos participativos, conferências de consenso, mesas de diálogo e controvérsia entre representantes e representados, etc., etc. Chamei a atenção para as condições do exercício da participação que quase sempre escapam aos teóricos ocidentais: o respeito efectivo pelos direitos humanos, a paz, a segurança individual e colectiva, a garantia dos meios de sobrevivência e o acesso à informação que torne esclarecidos o voto e a participação.
Estes e muitos outros temas foram debatidos: pluralismo, cidadania, identidades e democracia; guerras, terrorismo, segurança e direitos humanos; culturas, territórios e autonomias; uma nova ordem mundial democrática; o papel da ONU na defesa e promoção dos direitos humanos; impactos ambientais, sociais e económicos das políticas anti-drogas; conflitos e violência urbana; novas práticas de cidadania global; guerras, crise humanitária e resistências civis; drogas: despenalização, legalização ou proibicionismo.
Ao acolher esta discussão mundial, a Colômbia mostrou que uma outra Colômbia é possível, uma Colômbia não satanizada pelo proibicionismo anti-droga e pela violência. Foi precisamente esta mensagem de solidariedade que enviei a Gabriel Garcia Marquez, através de seu irmão, na Fundação Nuevo Periodismo, criada por Gabo em Cartagena, para ensinar aos jovens jornalistas que um outro mundo é possível.