2017 apresenta-se carregado de imprevisibilidades e de ventos incertos à escala global e europeia. Estamos perante a ausência de mapas de navegação fiáveis e observa-se a utilização de mapas distorcidos, que nos deixam a perspetiva de, a qualquer momento, poderem surgir calhaus e icebergs não assinalados a provocarem penosos acidentes.
Na União Europeia (UE) prosseguem os truques, o empurrar do lixo para debaixo do tapete e o adiar de decisões. São salvaguardados os interesses do poder financeiro e económico, do poder da Alemanha e suas áreas de influência, em detrimento da busca de um rumo seguro para o projeto europeu.
Nos Estados Unidos da América, Obama já se despediu e no próximo dia 20 – que seja um dia de consciencialização dos problemas que vivemos e de compromisso de luta – entrará em cena, em pleno, Donald Trump.
Obama tinha trazido esperança nas suas mensagens e em alguns dos seus objetivos de governação, em simbolismos de mudanças que representava. Pode admitir-se até que os seus mandatos tenham evitado males maiores. Mas Obama não cumpriu várias promessas, apoiou a exportação da “crise 2007-2008” em vez de agir para a conter, foi incapaz de travar a promiscuidade de poderes e a degradação da política, não travou focos de tensões e guerras e abriu, em parceria com alguns europeus, o drama da Líbia, a instabilização total e destruição da Síria, o delicado problema da Ucrânia, entre muitos outros.
Por vezes as oportunidades desperdiçadas agravam os cenários de partida. Tanto erro e contradição tornou-se contexto propício para o surgimento da “besta apocalítica” que Trump parece ser, face à forma provocatória e à inconsistência (planeada?) do seu programa/não programa. Arrepia-nos o seu desrespeito pelas mulheres e pela pessoa humana em geral, o ódio racial, o achincalhar dos direitos no trabalho, o desprezo pelo conhecimento e pela ciência, a forma provocatória e belicista como coloca os seres humanos, os povos e os países uns contra os outros, o desprezo pelas organizações e instituições e pelo Direito, a supremacia que atribuí ao dinheiro mesmo que este seja absolutamente sujo.
No plano nacional nem tudo é incerteza e surpresa na navegação de 2017. Alguns icebergs que nos surgem eram há largo tempo bem visíveis no horizonte. É o caso da dívida pública, da subida dos juros nos mercados primário e secundário e da fatura do Novo Banco. Era de há muito evidente que as políticas dos Bancos Centrais seriam um dia revertidas e que isso, muito provavelmente, aconteceria aos primeiros sinais de criação de emprego. Esse dia chegou e com ele o efeito esperado nas taxas de juro. Quanto ao Novo Banco, depois da experiência dos últimos anos, que instituiu a obrigação de os portugueses pagarem os buracos da banca, seria preciso ser-se muito ingénuo para acreditar na promessa de gratuitidade de Passos Coelho no momento da “resolução” do BES.
A grande questão é que icebergs como estes impõem mudança de rota. A mudança que a dimensão e os encargos da dívida e a situação do setor bancário exigem. É mais premente a necessidade de o país preparar e desencadear uma iniciativa junto das instituições europeias, de preferência articulada com outros países, que coloque os temas da dívida e da situação do crédito mal parado nos bancos, no centro da agenda política. Parece pouco sensato continuar-se à espera de melhor oportunidade. E enquanto se prepara e põe em marcha esse plano, há decisões, mesmo que unilaterais, que têm de ser assumidas pelo Governo.
No caso Novo Banco, as opções pela venda ou pela liquidação são alternativas a excluir. A nacionalização impõe-se, até face à estratégia da UE que pretende a sobrevivência apenas dos grandes bancos europeus. Contudo, é preciso ter presente que as nacionalizações podem ter diversos significados e implicações. Uma nacionalização orientada para a procura de compradores no mercado a curto prazo, não é o mesmo que o uma nacionalização sem prazo. Gerir para engordar o balanço e obter resultados financeiros a curto prazo, não é o mesmo que gerir para consolidar o banco e reforçar o seu papel na economia portuguesa. É urgente uma banca saudável e a funcionar.