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09-10-2016        Jornal de Notícias

Não é possível Portugal desenvolver-se continuando com uma elevada taxa de desemprego e sem condições para melhorar significativamente o investimento público. Uma análise objetiva destes dois grandes problemas mostra-nos o cerne dos perigosos aprisionamentos em que está metido este país. E, desafia-nos à construção de uma dinâmica social bem mais ofensiva que a observada nos últimos anos.

Para a Direita e para Bruxelas, o desemprego resolve-se eliminando direitos no trabalho, precarizando, renegando o objetivo do pleno emprego e responsabilizando as pessoas pela sua "empregabilidade", fazendo desaparecer a contratação coletiva, desvalorizando o salário mínimo nacional, cortando nos salários. Ora, essas políticas empobrecem e provocam exclusão social, acentuam desigualdades, desqualificam as pessoas, geram doenças e conflitos, afastam a modernização da economia e a utilização dos conhecimentos e das tecnologias, diminuem a capacidade de produzir riqueza. Ao mesmo tempo, a pressão para a emigração faz desaparecer do país muitos dos portugueses mais qualificados e mais jovens. O uso e abuso das chamadas políticas ativas de emprego - prática levada ao extremo com o Governo da Direita -, em grande parte dos casos, apenas escondem desemprego; mas alimenta abusos de patrões que não sabem viver sem parasitar desempregados, trabalhadores em absoluto estado de necessidade e o Orçamento do Estado (OE).

Sejamos claros: se Portugal mantiver uma elevada taxa de desemprego por 15 ou 20 anos, como em certos meios já se admite, não existe qualquer possibilidade de a sociedade portuguesa se desenvolver. Teremos um definhamento contínuo. Entretanto, se a cura assentar na cartilha atrás enunciada, teremos retrocesso acelerado do nosso patamar de desenvolvimento.

Quanto ao investimento público, os aprisionamentos também são muito fortes. Mandam-nos cortar na "despesa", mas já se tornou bem claro que os cortes na saúde, no ensino, na justiça, na proteção social, na estrutura de grande parte dos serviços da Administração Pública, nos criam graves problemas e muito sofrimento no presente e para o futuro. A União Europeia teima em impor regras de tratados injustos e decisões não democráticas do Eurogrupo. Não tem em conta as condições específicas dos países. De forma mentirosa, montaram a tese de que a crise resultou da divergência dos custos salariais na Zona Euro, e prosseguem na imposição de políticas que vão transferindo riqueza das esmagadoras maiorias das populações para os muito ricos, e dos países em dificuldades para os poderosos. Ostensivamente ignoram os bloqueios e contradições em que assenta o sistema da moeda única a que estamos sujeitos. Como é possível encontrar folga para incremento do investimento público se os muito ricos não querem pagar impostos de acordo com a sua riqueza, e se não há abertura para renegociação das dívidas?

Sempre, mas em particular no contexto em que estamos e se perspetiva à escala europeia e global, o relançamento do investimento público é imprescindível. Dificilmente surgirá significativo investimento privado sem essa alavanca.

Estamos em plena discussão do Orçamento do Estado para 2017 e os grandes meios de Comunicação Social centram o debate em possíveis desavenças entre os partidos que dão apoio parlamentar ao Governo. Não se mobilizam para discutir o que é fundamental para os portugueses, expondo o profundo conflito de interesses que nos está tolhendo. O presidente da Republica ressuscitou a tese da "realidade" que se opõe à ideologia, como se fosse possível definir qualquer realidade sem quadros de valores claros, sem ideologia.

O Governo e os partidos que lhe dão apoio parlamentar não vão, por certo, quebrar compromissos em resultado dos esforços a fazer para sintonizar o fundamental do que tem de ser inscrito no OE. O seu grande desafio, com estratégias próprias, é preparar e encetar debate que pegue a sério a resolução dos grandes bloqueios que enfrentamos e a mobilização da sociedade no seu todo. Discutindo com frontalidade a formação, a distribuição e redistribuição da riqueza.
 


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva