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11-09-2016        Jornal de Notícias

Um dos compromissos mais significativos que o atual Governo assumiu na área do trabalho foi, sem dúvida, o de desbloquear e dinamizar a negociação coletiva e de combater a panaceia da individualização das relações de trabalho. Compromisso de enorme importância para os trabalhadores e trabalhadoras, desde logo para os jovens, mas também para as empresas e para a economia, para o desenvolvimento do país, para a determinação das bases primárias e primeiras que estruturam a distribuição da riqueza e ancoram a inclusão e a justiça social.

É urgente encetá-lo! Com a participação ativa dos sindicatos e das organizações patronais, do Parlamento, de várias áreas da academia e de especialistas. O debate, que se quer sólido, não pode ser feito com base em argumentos de senso comum forjados no neoliberalismo que nos sufoca. É indispensável um contributo sério da Comunicação Social, mas hoje, os formadores de opinião que dominam as agendas dos grandes órgãos de comunicação, tratam o trabalho como mero custo e com um chocante misto de ignorância e pesporrência.

As sociedades mais avançadas em que vivemos construíram-se na afirmação dos valores do trabalho, do sindicalismo, da organização coletiva dos trabalhadores e seu direito à negociação, e da consagração do Direito do Trabalho. A negociação coletiva constituiu-se, à escala global, como o mais positivo instrumento de políticas para uma melhor distribuição de riqueza, durante toda a segunda metade do século XX. Ao consolidar direitos/deveres coletivos no trabalho, deu força e enquadramento moderno ao conceito comunidade, em particular no espaço do trabalho, firmou dimensões de cidadania, e criou bases para potenciar as liberdades individuais.

O Observatório sobre Crises e Alternativas publicou, esta semana, um Caderno intitulado "O desmantelamento do regime de negociação coletiva em Portugal, os desafios e as alternativas", da autoria de Maria da Paz Campos Lima, cuja apresentação pública ocorrerá no dia 131 .

O estudo identifica traços da tradição da negociação coletiva na Europa Ocidental e as tendências de mudança marcadas pela emergência da agenda neoliberal e depois pela "crise internacional de 2008". Examina os seus desenvolvimentos no nosso país - sobretudo no período de intervenção da troika -, avalia e discute a amplitude e intensidade do desequilíbrio das relações laborais e, em particular, da erosão da negociação coletiva.

A autora mostra-nos, em primeiro lugar, por que Portugal representa, nos estudos comparados da UE, um exemplo de forte erosão e ataque à negociação coletiva e, em segundo, torna evidente que essa erosão teve por base, sobretudo, a queda do número das convenções atualizadas e a respetiva cobertura. Os seus efeitos nas políticas salariais e nos direitos dos trabalhadores foram muito negativos. Vingou o objetivo da "flexibilidade salarial descendente", um dos mais importantes da chamada desvalorização interna.

O trabalho desta académica, profunda conhecedora do tema às escalas nacional e europeia, formula sugestões e propostas para este processo que o Governo tem de implementar. Como sabemos, se não houver ação política, os mercados definem e estruturam esquecendo o social, o cultural e o político.

A efetivação da negociação coletiva é indispensável para combater a degradação salarial, garantir que "o trabalho não é uma mercadoria" e o princípio universal de "a trabalho igual salário igual", para manter vivo o objetivo da harmonização social no progresso.

Em termos relativos e absolutos nunca o trabalho produziu tanta riqueza como hoje e, historicamente, foi na contratação coletiva que se desenvolveram os melhores e mais eficazes compromissos ao nível do concreto das relações de trabalho favorecendo a produção, a gestão, a organização do trabalho e o avanço qualitativo dos bens e serviços produzidos.

São os direitos/deveres coletivos devidamente garantidos que propiciam a cada trabalhador, e em particular aos jovens, as condições de fruição das liberdades individuais que tanto marcam as nossas sociedades.

1 Caderno e programa do debate disponíveis em: www.ces.uc.pt/observatorios/crisalt


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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