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01-11-2015        Jornal de Notícias

A sensatez não é de Direita e muito menos a Direita tem o monopólio da sensatez. Há uma espécie de sistema de crenças, de caráter absolutista, produzido pelos poderes dominantes e reproduzido pelos formadores de opinião dos grandes meios da Comunicação Social, que nos tenta impingir uma dicotomia que coloca a Direita do lado certo da interpretação do interesse nacional e defensora do rigor orçamental, atribuindo à Esquerda comportamentos de aventureirismo económico e de despesismo irresponsável.

As práticas e o debate político que estamos a viver no país põem a nu esta falsa dicotomia: vem ao de cima, de forma clara, que os traços marcantes que distinguem a Esquerda da Direita se situam, acima de tudo, no campo da justiça social, nos valores e princípios que colocam os cidadãos no centro das soluções políticas.

Cavaco Silva fez, nos últimos meses, teorizações sobre as instabilidades políticas e a importância de governos com apoio maioritário na Assembleia da República (AR). Mas os resultados das eleições de 4 de outubro não lhe agradaram e a sua sensatez de imediato se esfumou, passando ele próprio a produtor de medos e a gerador da incerteza quanto a quem vai governar. Arvora-se em exclusivo intérprete do "superior interesse nacional", situando-o na subjugação a poderes externos e aos mercados e na quase total ausência dos direitos, interesses e responsabilidades dos portugueses. Porquê o presidente da República se refugia em procedimentos que a Constituição da República lhe permite adotar, apenas para impor o seu Governo, quando sabe que a maioria da AR o derrotará? Quanto vai custar ao país esta falta de sensatez?

No dia em que deu posse ao Governo fantasma e aparelhístico de Passos Coelho, Cavaco Silva insistiu em credibilizar os cenários cor-de-rosa dos êxitos da austeridade e do empobrecimento. É significativo que nesse mesmo dia o presidente da CMVM tenha vindo a público denunciar a "falta de ética existente na banca e nos negócios" e o Ministério Público tenha denunciado e acusado um agiota (académico de Harvard) que em 2010, denegrindo a dívida púbica portuguesa e especulando a partir daí, obteve 819 mil euros de mais-valias. Passaram quase cinco anos a subjugar o povo e a culpabilizá-lo pelos problemas do país, ao mesmo tempo que fecharam os olhos aos roubos, passados e presentes, e ao crescendo das desigualdades e injustiças.

O país está carente de justiça social. A convergência de esforços das forças de Esquerda pode e deve responder positivamente a esse desafio. Os compromissos para o atingirem têm de ter um grande equilíbrio entre o social e o económico, o que implica a necessidade de serem desenhadas e implementadas em simultâneo, as políticas nestes dois campos.

Sem dúvida, é preciso atenção ao equilíbrio orçamental, mas grande parte das medidas mais prementes, por exemplo na área do trabalho - garantia de salários dignos, atualização do SMN, reposição de direitos fundamentais e combate à precariedade -, podem ser adotadas sem provocar desequilíbrios orçamentais e até podem ter efeitos muito positivos na economia e logo, por consequência, nas receitas do Estado.

A reposição dos cortes em pensões de reforma, nos salários e em direitos dos trabalhadores da Administração Pública, bem como em algumas condições de acesso à Saúde ou à Justiça, têm, com certeza, impacto no Orçamento. Isso obriga a trabalhar equilíbrios entre a viabilidade orçamental, a justiça social e a dinamização da economia. É isto que as forças de Esquerda serão capazes de fazer e a Direita jamais faria, porque a centralidade das suas preocupações é o lucro em benefício de quem já detém a riqueza, transformando todos os direitos sociais fundamentais e até a pobreza em áreas de negócios.

O país precisa de crescimento económico, mas também de desenvolvimento humano. Exige-se rigor na obtenção das receitas e na gestão das despesas, mas é indispensável uma ação política de exigência social, moral e ética quanto à distribuição da riqueza.

No atual contexto ser revolucionário exige muita moderação, mas é preciso ser ofensivo, sem tréguas.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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