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30-07-2015        As Beiras

Um tal cenário é, de momento, inimaginável. Mas se depender só dos partidos, “destes” partidos, digamos que paira no ar uma morte anunciada do regime democrático. Dir-se-á, invocando a velha frase atribuída a Winston Churchill que a democracia, por muito imperfeita que seja, é o regime político menos mau comparado com todos os outros. Mas hoje isso já pouco diz ao cidadão comum. O que temos assistido nas últimas décadas é uma sucessão de ataques à democracia, que surgem de vários lados. Nos tempos mais recentes, são as próprias instituições europeias quem mais tem atrofiado o funcionamento dos sistemas democráticos. A democracia é uma planta muito frágil que precisa de ser regada diariamente, mas infelizmente o que alguns dos seus principais agentes têm vindo a revelar é a sua aptidão para subverter as regras democráticas.

Digamos, portanto, que a democracia tem vindo a ser subvertida em dois planos, que hoje parecem conjugar-se. Por um lado, são os poderes económicos de um capitalismo desenfreado, rendido à força do mercado e do dinheiro e aos múltiplos interesses que à sua sombra se expandem, mortalmente lesivos dos princípios democráticos. Financiamentos ilegais de campanhas eleitorais, promoção de testas de ferro, candidatos fantoches, quadros e dirigentes ao serviço de esquemas dominados pela corrupção, etc., são exemplos de que o vírus cancerígeno da democracia tudo subverte. Por outro lado, são as próprias estruturas partidárias que, na sua obsessão pelo poder, alimentam as mais perversas ligações e oligarquias na defesa das suas negociatas, reprimem o contraditório e combatem o debate democrático interno, que são a essência da democracia política.

Não desejamos, evidentemente uma democracia sem partidos, até porque um tal cenário significaria o regresso à ditadura. São os partidos que se autodestroem ao desrespeitar as regras democráticas e os cidadãos, ao fazerem tábua rasa das suas promessas, ao ignorarem a ética, a honradez e a transparência. Só a sociedade civil e os seus movimentos de cidadãos podem obrigar os atuais partidos (sobretudo os habituados ao poder) a mudar de registo. Precisamos de uma mudança estrutural do sistema político e uma radical refundação das estruturas partidárias no sentido da abertura à sociedade, da transparência e da revitalização. E isso só pode ocorrer com base em novas articulações entre partidos e movimentos.

A Europa está em risco de fragmentação e, caso as respostas aos atuais bloqueios sejam no sentido do regresso aos velhos nacionalismos, estaremos mais próximos de nos afundar no abismo e na guerra. E os partidos “de poder” dão mostras de nada ter aprendido, a começar pela família europeia “social-democrata” que abriu as portas à globalização, ao mesmo tempo que em nome do “pragmatismo” da “conquista do centro” do eleitorado, foi abandonando os velhos valores republicanos e hoje, como se vê, apenas se ocupa com a contagem de votos e a melhor maneira de oferecer alguns tachos aos homens do aparelho e “novos-ricos” da vida partidária, deslumbrados com o poder e que não sabem, nem querem, fazer outra coisa. A generalização é propositada (as exceções confirmam a regra). Não há soluções salvíficas nem modelos perfeitos, mas existem propostas alternativas que podem ajudar a mudar de rumo. Basta que o eleitorado consiga destrinçar o trigo do joio.


 
 
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Elísio Estanque



 
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