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14-06-2015        Jornal de Notícias

O que moveu o Presidente da República (PR) para condecorar Teixeira dos Santos a 10 de junho deste ano? Não foi certamente a apreciação feita à sua carreira profissional ou ao desempenho como Ministro das Finanças até maio de 2011, pois se assim fosse já o teria condecorado em ano anterior. Teixeira dos Santos só pode ter sido condecorado pelo “mérito” de ter chamado a troika sem praticamente ter dado cavaco a ninguém no governo a que pertencia, segundo rezam as crónicas. Aquela distinção tem assim, objetivamente, o mesmo significado que condecorar a troika. Teixeira dos Santos recebeu uma condecoração em nome do Estado, mas numa conceção de Estado não soberano e numa vingançazinha contra o povo português.

O PR achou apropriado prestar vassalagem ao ocupante – agradecer-lhe – mesmo depois de este, pelo menos formalmente, ter feito recuar o exército de ocupação, passando a fazer periódicas incursões de observação. Cavaco Silva com o seu ato vinca, perante o povo português, quem manda. E, em nosso nome, “disse” que o PR de Portugal é submisso e agradecido ao poder dos “mercados”.

Os portugueses não mereciam ter tido em 2011 um Ministro das Finanças a quem apenas ocorreu que “não havia dinheiro para pagar salários e pensões” e que foi incapaz de, sequer, conceber que o dinheiro que não havia poderia ser o dinheiro destinado a pagar juros e amortizações aos bancos alemães e franceses por uma dívida tornada insustentável. A opção portuguesa ajudou a desresponsabilizar esses bancos pelos graves problemas que haviam criado em quase toda a zona euro e facilitou as políticas dicotómicas contra os “malandros” do Sul.

Os portugueses não merecem um presidente que, para além de já ter protegido e condecorado as mais relevantes figuras de gestores que afundaram empresas, bancos e interesses do Estado em negociatas vergonhosas, permeia agora o ato que tanto nos fez e faz sofrer. As receitas da troika assentaram em mentiras e humilhações, significaram um recuo, no plano social e económico, de mais de uma década e impuseram a emigração de grande parte de uma jovem geração, sem a qual não será possível concretizar um novo impulso de modernização e desenvolvimento do país.

Cavaco Silva merece o título de político português mais dissimulado e ronha que o nosso Regime Democrático gerou. Ele é incapaz de conviver de mente aberta e consciência tranquila com a pluralidade de projetos políticos que se expressam na sociedade e, por isso, a sua nata inabilidade para interpretar e representar todos os portugueses e o seu sistemático recurso a atos mesquinhos com cheiro a vingança.

Já meio mundo reconheceu o caráter partidário do discurso do PR proferido no passado dia 10, mas o que mais nos deve preocupar – à generalidade dos cidadãos – é a ausência de uma análise sobre os problemas concretos das pessoas, o distanciamento do social enquanto dimensão estruturante das nossas vidas, o seu determinismo em secundarizar as escolhas programáticas que os eleitores quererão fazer nas próximas eleições legislativas e o distanciamento das implicações da nossa condição de membros da União Europeia (UE), exatamente no tempo em que se torna cada vez mais claro que as “soluções” em fabrico para a Grécia contagiarão toda a UE e de forma muito mais direta e intensa, a situação de Portugal.

A questão da insustentabilidade da dívida pode tornar-se grande problema bem mais cedo do que o previsto, as políticas económicas não podem situar-se meramente nos tópicos que Cavaco Silva enunciou neste período de debate eleitoral em que estamos, há que mobilizar todos os portugueses e portuguesas na busca de políticas que combatam o desemprego e criem emprego, que garantam uma muito mais justa distribuição de riqueza, que nos assegurem saúde, proteção e segurança social, ensino e justiça.

Em vez da obstinação em condecorar a troika e de querer antecipar um programa de governo, o PR devia ter elencado, com verdade, os nossos problemas e desafios e mobilizado os portugueses para os debater e assumir.


 
 
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