Centro de Estudos Sociais
sala de imprensa do CES
RSS Canal CES
twitter CES
facebook CES
youtube CES
19-03-2025        As Beiras

Na última crónica, referi-me ao concurso de Alta Velocidade entre Oiã e Soure, dada que foi a inusitada posição assumida pelo concorrente único, cuja proposta subverte grosseiramente os termos do caderno de encargos fornecido pela entidade adjudicante, a Infraestruturas de Portugal (IP). Basicamente deixa por fazer tudo aquilo que está pensado há anos para otimizar a articulação da mobilidade local e regional com a alta velocidade. O executivo municipal prontamente tomou uma posição, a de não aceitar de todo essa candidatura e de pedir ao Governo que lance rapidamente um novo concurso e atualize os valores da adjudicação, para assim atrair os potenciais concessionários internacionais. Algumas forças políticas que se perfilam para a candidatura às Autárquicas foram unânimes na defesa dessa mesma posição PS, CDU, Livre, pelo menos, já se pronunciaram. A Assembleia Municipal, por proposta da CDU, também votou favoravelmente, embora perante a abstenção da maioria socialista. Mesmo o próprio consórcio concorrente, pela voz do CEO da principal empresa, afirmou recentemente que pretende um novo concurso com subida dos valores base.

O Ministro das Infraestruturas também disse ao Jornal de Negócios que admite lançar novo concurso sem esperar pelo novo governo, caso a IP esteja preparada para esse novo procedimento em tempo útil. Tudo parecia ir pelo bom caminho. Mas depois deixou cair a preocupante dúvida: — não sabe ainda se vai ser por reforço da verba ou por uma redução de obra.

Essa dúvida é dramática, Senhor Ministro. Aquilo que parecia um desfecho claramente favorável aos interesses da cidade e da região fica comprometido com essa nuance de linguagem, aparentemente insignificante. Por duas razões fundamentais.

A primeira é que qualquer “redução de obra” implica uma significativa alteração ao caderno de encargos. Na prática, e sendo claro, implica um novo caderno de encargos, o que, com todos os procedimentos associados e com muito boa vontade da parte de todos, provocará um atraso processual de mais de um ano.
A segunda razão é que não conseguimos perceber onde se vai reduzir a obra. Na quadruplicação da Linha do Norte? Para além de entupir definitivamente o tráfego regional e suburbano de passageiros vai obstaculizar o trânsito de mercadorias e comprometer ainda mais o desejável desenvolvimento do porto da Figueira e do terminal de Alfarelos, para não falar da futura plataforma logística de Mealhada – Souselas.

Parecendo-me lógico e decente que o Senhor Ministro não queira perder a oportunidade de fazer uma estação a sério no local onde está aquela bizarria surreal da Estação Velha, a única estação ferroviária de Coimbra neste momento, só há uma possibilidade para a tal “redução de obra”: será eliminar o viaduto com 30 metros de altura que atravessa os melhores solos agrícolas de Portugal numa extensão de mais de nove quilómetros, começa a sul da Ribeira e acaba a norte da Adémia. Tal como hoje, e como em Gaia, todos os comboios de alta velocidade passarão a parar na nova estação intermodal de Coimbra. Isso sim, era reduzir a obra, e poupavam-se largas centenas de milhões de euros. Para além do mais, seria o ainda governo da AD a dar continuidade a uma solução do governo de António Costa, o que não é despiciendo, em véspera de legislativas.

Será que os ecologistas mediaticamente mais ativos iriam apreciar esta “redução de obra”? Sinceramente não sei, mas atrevo-me a pensar que não. Que eu me apercebesse ninguém ainda protestou contra esse viaduto. E já agora, quando a A1 atravessou o vale do Mondego, alguém protestou? Não me apercebi, mas estou seguro que ninguém protestou quando, mais recentemente, a A17 atravessou os vales do Pranto e do Mondego de uma assentada.

Ou estou desatento, ou só ouço protestos quando se trata de beneficiar as acessibilidades a Coimbra, não percebo bem porquê. Para além do mais, é a mobilidade sustentável que está em jogo. Mas, aqui em Coimbra tudo é ainda possível, como eu já ouvi dizer a um Ministro do Ambiente, as populações têm de se acostumar à crise climática, mas perturbar, ligeiramente que seja, as ligações entre as metrópoles, isso nem pensar...


 
 
pessoas
José António Bandeirinha



 
temas
ferrovia    alta velocidade    ecologia    Coimbra