Gorée, 13 de Abril de 2017. Marcelo Rebelo de Sousa visitava, no Senegal, este antigo entreposto de tráfico de escravos nas rotas atlânticas. Antes dele, o Papa João Paulo II e o ex-presidente brasileiro Lula da Silva tinham já pedido perdão pelo sofrimento causado. Em Portugal, algumas pessoas esperavam o mesmo do presidente português.
Marcelo não pediu perdão. Pelo contrário, vangloriou a adesão a "um ideal humanista" quando, em 1761, Portugal “aboliu a escravatura” pela mão de Marquês de Pombal. Mas terá sido "um ideal humanista” que levou Marquês de Pombal a fazê-lo? E será que, até, a escravatura foi realmente abolida nessa data?
Cristina Nogueira da Silva, Professora na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, escreve poucos dias depois que "Em 1761 o marquês de Pombal não aboliu a escravatura em lugar algum. O que fez, por meio de um alvará publicado nesse ano, foi proibir o transporte de escravos para o Reino de Portugal, declarando livres todos os que, a partir daquela data, aí desembarcassem.” e que "Com este alvará não se queria abolir a escravatura no Reino, mas sim canalizar o maior número possível de escravos para os territórios ultramarinos, onde eles eram centrais para o funcionamento da sociedade e da economia.”.
A escravatura foi apenas abolida legalmente em 1875, mais de um século depois, mas esta deu lugar ao trabalho forçado e ao Regulamento do Trabalho do Indígena, que obrigava os “indígenas” das ex-colónias a trabalhar - sob pena de lhes ser “imposto o cumprimento” - e que continuou inscrito na lei até 1962, há pouco mais de 50 anos. O trabalho era civilizador, era a ideologia por detrás de tais leis.
É sobre essa “missão civilizadora”, sobre a forma como se materializava no trabalho forçado e no sistema de educação, e sobre como faz parte da narração da história colonial portuguesa, que falamos hoje. Como convidados, temos hoje José Pedro Monteiro e Miguel Bandeira Jerónimo, ambos investigadores e historiadores no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e autores de vários livros, a solo e em conjunto, sobre colonialismos, imperialismos.