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28-03-2003        Público
1. Porquê?
Esta pergunta continua a ser feita por milhões de pessoas que não se resignam a ser tratadas como imbecis pelos poderes que decidiram impor esta guerra ao mundo. É, de facto, de um escandaloso processo de imbecilização que se trata. Os mentores da guerra de agressão contra o Iraque encaram os cidadãos como acéfalos consumidores de reality shows para quem qualquer justificação serve, das armas de destruição em massa que ninguém encontra porque andam escondidas em camiões até à libertação das mulheres iraquianas.
Mas falemos sério: não é a posse de armas de destruição em massa uma ameaça para o mundo? É, certamente. Por isso mesmo é inaceitável o sinal dado ao mundo pela administração Bush, em 2000, ao romper unilateralmente o tratado sobre mísseis anti-balísticos (ABM). E também por isso é tão grave a mensagem agora dada por este governo dos Estados Unidos com a guerra de agressão contra o Iraque (onde não se provou a existência dessas armas), ao mesmo tempo que se "poupa" a Coreia do Norte (que não só as tem como as exibe e as promete publicamente vender a regimes inimigos dos Estados Unidos): pelos vistos, ter efectivamente armas de destruição em massa não só não é condenável como é mesmo a melhor garantia de não vir a ser atacado.

2. O Presidente Bush pediu que os prisioneiros de guerra norte-americanos sejam tratados com humanidade pelos iraquianos. Por seu lado, Donald Rumsfeld afirmou que a exibição destes prisioneiros na televisão é uma violação grosseira das Convenções de Genebra sobre o direito dos conflitos armados. Têm ambos absoluta razão.
O Direito Internacional - o tal que está completamente ultrapassado porque reproduz o mundo antigo, herdado de 1945, portanto anterior à dominação imperial dos Estados Unidos - tem mesmo que ser preservado na sua função reguladora das relações internacionais. Porque, como agora sentem justificadamente Bush e Rumsfeld, o direito que menosprezamos e violamos hoje, é o mesmo que nos defenderá amanha quando formos agredidos.
Ficamos, pois, todos com a esperança de que aos prisioneiros de guerra alegadamente talibãs, detidos na base norte-americana de Guantanamo, seja finalmente dado um tratamento de mínima dignidade que lhes foi negado até hoje pelos Estados Unidos.

3. O Pentágono sugeriu às televisões americanas para não transmitirem as imagens dos prisioneiros de guerra nas mãos do Iraque antes de as famílias serem avisadas. O Pentágono sabe, por experiência, que a guerra há muito que se ganha ou perde na opinião pública quase tanto como no teatro de operações. Este é, por isso, o tempo dos censores.
Hetero e auto-censores. Com argumentos do quilate de "os franceses são uns imbecis que nos apunhalam pelas costas" ou "Hans Blix é um choramingas pusilânime", a WABC - nada menos que a emissora mais ouvida em Nova Iorque - decidiu não permitir a participação de ouvintes contrários à guerra nos seus programas. Por seu lado, os apresentadores da Fox News passaram a tratar Saddam Husein não pelo seu nome mas por "carniceiro de Bagdad". E a mesma Fox News contratou Oliver North (condenado no caso Irão-Contras) como enviado especial ao Iraque. North mostrou-se eloquentemente agradecido: "as minhas crónicas não são profissionais, nem objectivas nem merdas dessas" (sic).
A democratização do Iraque está, portanto, em boas mãos. Claro, só há censura porque estamos em guerra. Mas quando é que vamos deixar de estar? Não foi Bush que nos prometeu que só quando o eixo do mal estivesse derrotado é que esta guerra infinita terminaria? E entretanto como é que ficam as nossas liberdades?

 
 
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José Manuel Pureza