O que nos mostram as eleições nos Estados Unidos da América (EUA), a euforia da bolsa face à eleição de Donald Trump e a postura de governantes europeus no atual cenário?
Que o capitalismo age à rédea solta, como máquina afinadíssima de concentração de riqueza, de exploração de quem trabalha (e as “classes médias” cilindradas), de reprodução contínua de pobreza e miséria, mesmo em países onde se produz, ou onde circula, imensa riqueza. Os elevadores sociais são boicotados. Nunca os mais ricos foram tão ricos, e nunca foram tão poderosos. O capitalismo ultraliberal promove o ultraconservadorismo e o fascismo, nos EUA, na Europa e noutras latitudes. Já não os dispensa. E precisa da guerra.
Esta engrenagem infernal sustenta-se na criação de estabilidade para os mecanismos de apropriação indevida de riqueza (tornados legais) e na insegurança da esmagadora maioria dos seres humanos. Observando a governação de muitos países, constatamos que a decência na política está abaixo de zero. Cultiva-se o desrespeito pelo outro, nega-se o humanismo, imperam as discriminações, atacam-se as instituições de representação coletiva, elementos fundamentais para o combate às desigualdades, para integrar as pessoas na vida coletiva e para a democracia. Endeusa-se o lucro e sacrificam-se as pessoas para haver crescimento económico que não se reparte.
Uma base fundamental da liberdade assenta na satisfação de necessidades básicas das pessoas. Essa satisfação não está a ser garantida e é fomentada a suspeição e o ódio entre a imensidão dos que ou não chegam a ter plena cidadania, ou vão sendo deserdados. Falta emprego digno e existe muita precariedade. Há salários de miséria e é impossível aceder a habitação condigna, mesmo com governações que se dizem democráticas. Temos, assim, vidas em desespero, o caldo para a loucura e a alienação, para o retrocesso social, cultural e político.
Comentadores e “especialistas” entretêm-se em intrincados exercícios de explicação sobre o que originou e significa a vitória de Trump, o fracasso dos governos alemão, francês e outros, o avanço da extrema-direita, quando as respostas são bastante simples. Falta é coragem para assumir as causas dos problemas sem floreados. Derrotar os poderes instalados, isso sim, é complexo e exige coragem.
De repente, dirigentes políticos europeus que urdiram as dependências da União Europeia face aos EUA afirmam a necessidade de autonomia do “projeto europeu”. Há muito que precisamos de uma política para o Cáucaso que não passa por pegar num serrote e cortar o Continente separando a Rússia; de políticas respeitadoras de valores universais e direitos humanos com o Médio Oriente, a África, a América Latina e a China.
Necessitamos de coisas simples: paz, melhor distribuição da imensa riqueza existente, imigrantes com direitos, pão, emprego e salários dignos, justiça, saúde e habitação.