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26-03-2014        i

O país pobre e dependente que o governo deseja pode até estar melhor, mas os portugueses estão muito pior, diz a OCDE no seu último relatório Society at a Glance.

Os dados apresentados, não constituindo propriamente uma novidade, traçam um retrato assustador da evolução do nosso país sob os efeitos da crise e das medidas de austeridade fanaticamente implementadas pelo atual governo.

Portugal é o país da OCDE onde a desigualdade de rendimento disponível dos agregados mais aumentou por efeito da crise, a seguir à Islândia. Ou seja, onde a crise mais polariza e segmenta os grupos sociais. O número de pessoas a viver em agregados sem nenhum rendimento proveniente do seu trabalho aumentou cerca de 20%.

No aumento do desemprego estamos em terceiro lugar, depois da Espanha e da Grécia. O desemprego de longa duração e a perda de direito a subsídio de desemprego sufocam as oportunidades de reinserção profissional e laboral de grande parte das pessoas.

Os maiores cortes e ataques produzidos pelas medidas de consolidação orçamental acontecem nas transferências sociais (assistência social, apoio no desemprego, apoio na deficiência e outros apoios às famílias). Ao cortar, o Governo abandona as pessoas e as famílias, cego pela disciplina imposta pela Troika. Mas acontecem também na saúde, onde o Governo corta mais 1% do PIB, reduzindo a qualidade e o acesso dos cidadãos aos serviços de saúde, cada vez mais incapazes de dar resposta às populações.

Outro dado alarmante é o de que o padrão de redistribuição prosseguido ao nível das transferências sociais além das bruscas reduções, está a funcionar ao contrário, dando mais a quem menos precisa. Ou seja, o governo está a transferir mais para as famílias com mais rendimentos, e menos para as famílias mais vulneráveis. Com efeito, estas recebem apenas 71% do total de transferências, e menos de metade do valor transferido para as famílias de maiores rendimentos. Isto não só reduz a eficácia das medidas no combate à pobreza, como acentua a desigualdade e a polarização social.

A crise está a afetar especialmente os agregados com crianças e com jovens. Os dados indicam a tendência de serem especialmente os jovens os que estão em maior risco de pobreza.

Portugal foi dos países onde os efeitos da crise mais atingiram a população jovem. São estes os que veem a sua situação comparativa mais afetada pela deterioração do mercado de trabalho. A taxa de desemprego das pessoas entre os 15 e os 25 anos aumentou cerca de 20% entre 2007 e 2013; e a proporção de jovens que nem estudam, nem trabalham, nem estão em formação é já de 15,3%.

Por tudo isto, somos o quarto país onde as pessoas estão menos satisfeitas com o apoio do estado social, o terceiro dos menos satisfeitos com a saúde (depois do Japão e da Coreia), e o país onde a satisfação com a vida mais caiu (a par dos gregos, espanhóis e italianos).

Portugal foi, com a Irlanda, o país em que a confiança no governo e nas instituições financeiras mais caiu entre 2009 e 2012, especialmente por parte dos jovens. O que explica o seu menor envolvimento político e quebra no seu otimismo perante o futuro.

Paralelamente, diz o relatório, a informalidade e a corrupção aumentaram.

Mas somos também das populações que mais participam em voluntariado e campanhas de donativos para instituições de caridade. Expressando este facto os nossos ideais igualitários, ainda esta semana salientados no estudo do European Social Survey, serão sempre insuficientes, no entanto, para a mudança necessária.

A OCDE aconselha o Governo a mudar de rumo, ou seja, a investir em medidas de política social de contraciclo. Só assim, com apoio social eficiente para aumentar o bem-estar se minorarão os efeitos económicos e sociais catastróficos que os atuais cortes terão no futuro. A fatura está passada para as próximas gerações pagarem. Mas o governo parece querer insistir na receita que nos mata, falando já num corte de mais dois mil milhões de euros na despesa para satisfazer as mais recentes exigências da troika. O fundamentalismo neoliberal pode ser bom para vossos negócios, mas dá-nos cabo da vida, Sr. Primeiro-Ministro!


 
 
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Rosa Monteiro



 
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