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10-01-2014        Diário de Notícias

Há tempos, Pacheco Pereira confessava-se membro de uma espécie em vias de extinção no PSD: os social-democratas. Os sorrisos que então provocou podem denunciar algum nervoso. Porque o risco de extinção dos verdadeiros social-democratas, se nunca foi um problema para o PSD, é hoje o maior problema de identidade do Partido Socialista. Quando a direção do PS exibiu convicção e entusiasmo na aceitação da proposta da direita de que Portugal fosse o primeiro país a aprovar o Pacto Orçamental, foi esse afastamento radical da matriz fundadora social-democrata que se evidenciou plenamente.

A cooptação dos partidos socialistas, trabalhistas e social-democratas europeus, talhados nas lutas sindicais contra a exploração do trabalho, pela onda neoliberal que, desde a década de oitenta, fez das universidades europeias e norte-americanas o trampolim para a tomada do poder político e empresarial pôs fim à relação de forças que permitiu a afirmação do Estado de Bem-Estar como marca da Europa no segundo pós-guerra. O blairismo, replicado por Schroeder na Alemanha ou por Guterres em Portugal, esterilizou as formações social-democratas como alternativas políticas efetivas e converteu-as aos cânones do centrismo político, do ponto de vista ideológico e do ponto de vista programático. E essa conversão não foi repudiada desde então.

É da consciência do caráter nevrálgico desta realidade e das suas consequências que tem que partir todo o esforço de construção de uma alternativa política em Portugal e na Europa. A questão crucial que esse esforço tem que enfrentar é a da opção reiterada do Partido Socialista por se assumir, acima de tudo, como integrante de um arco da governação que baliza a política prática com limites caros à direita. Se há fator de bloqueio à esquerda que dificulta uma governação alternativa, em Portugal e na Europa, é essa opção das direções dos partidos socialistas, em Portugal como na Europa, por uma governação pautada pelos critérios de ”estabilidade”, “responsabilidade” e de “razoabilidade” partilhados serenamente com a direita.

Na construção de propostas políticas não vale a dicotomia entre puros e impuros, entre anjos e diabos, é bem verdade. Mas distribuir indiferenciadamente por toda a esquerda a responsabilidade das dificuldade de construção de uma alternativa – ou inclusivamente focá-la privilegiadamente na esquerda à esquerda do PS - é algo que distorce a realidade. Não foi a esquerda que empurrou o Partido Socialista para a aprovação do Pacto Orçamental, para a aprovação do código do trabalho, para a escolha da diminuição do subsídio de desemprego como medida emblemática do PEC 1, ou para a inclusão da privatização dos CTT no PEC 4. O seu a seu dono. Desculpabilizar deste modo as lideranças socialistas e responsabilizar a esquerda à esquerda do PS por aquilo que é uma escolha consciente e livre daquelas lideranças é algo que só ajuda a que tudo fique na mesma.

Todos os sectarismos e paroquialismos são condenáveis diante do imperativo da construção de uma política diferente para o país e para a Europa. Por isso mesmo, nunca uma iniciativa de esquerda vinda do Partido Socialista, no Governo ou na oposição, deixou de fazer caminho por não ter o apoio das esquerdas. Se o que decidisse o desbloqueamento da alternativa necessária fosse a disponibilidade para governar, a questão seria bem simples, portanto. Mas não: aquilo que verdadeiramente bloqueia uma alternativa de governo à esquerda não é a disponibilidade, ou falta dela, para governar. São as escolhas para a governação de Portugal e da Europa. É a clarificação disso e das suas condições de viabilidade que se exige.


 
 
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José Manuel Pureza