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09-06-2013        Público

Pedem-me para falar sobre o planeamento urbano de Coimbra. Mas o que Coimbra precisa é de um encenador e de um mágico que lhe reconfigure a alma. Sendo uma cidade delimitada pela paisagem, o essencial nesse planeamento seria a confirmação desses limites, densificando-se como aglomerado medieval e iluminista. Coimbra não precisa de ser "moderna"; precisa de ser ainda mais arcaica e ao mesmo tempo mais do futuro. De ir muito para trás e muito para a frente; no presente, definha. Precisa de canalizar o espírito de Cottinelli Telmo, arquitecto e cineasta, que projectou a intervenção na Alta e reencontrar-lhe a monumentalidade, a solenidade semifascista. Isto é, precisa de se ver livre da lata democrática dos automóveis e das camionetas dos turistas. Até ficar apenas a sombra agigantada das capas como no filme Rasganço de Raquel Freire; pequenos cientistas e poetas em trânsito; "alguém escreveu o teu nome em todo o lado". Com uma ligação mecânica high tech a fazer troça das escadas Monumentais e com isso a refundar a sua arcaica severidade. Com residências para professores, estudantes, e toda a gente, numa penthouse forjada no que antes era a Faculdade de Medicina. Implodindo de luz o monocromático dos edifícios, com estúdios para os novos empreendedores e novas utilizações para as salas e auditórios de clandestina modernidade. Até chegarmos à Sala de Exame Privado onde António Olaio canta perpetuamente My Own Moon para a galeria de Reitores retratados.

Descendo à cidade, seria preciso consagrar o Teatro Gil Vicente como a charneira entre a universidade e o mundo lá fora. Ampliando o excelente programa de cinema e transformando-o na Sala de Cinema do país; reformulando o espaço interior para acomodar este programa-farol; invadindo massivamente o seu magnífico bar.

Descendo mais ainda, teríamos de transformar a reabilitação da "Baixinha" num caso de estudo europeu. Olhando, a propósito, para a intervenção que se chama Casa da Escrita, de João Mendes Ribeiro. E depois, ainda, pegar na vergonha da estação de Coimbra B e transformá-la em Coimbra R, um anúncio e um statement: nem Norte nem Sul; nem interior nem litoral; um sítio de passagem e de destino. E uma "marca", se posso ser assim prosaico, sem paralelo.

Lisboa despreza Coimbra, cometendo o erro de não perceber que se despreza a si mesma; Coimbra é uma região autónoma de Lisboa-Portugal.

Como vingança, talvez se possa reerguer entre a Figueira da Foz e a bela cidade de Salamanca; entre o mar e Espanha, que é afinal onde sempre estivemos.

No dia em que Coimbra renascer - o que pode ser praticamente amanhã, como deixei claro -, poderemos finalmente abandonar a treta de sermos pobres, pequenos e tristes.


 
 
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Jorge Figueira



 
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