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12-05-2013        Público

Normalmente não se relaciona o esforço de desenvolvimento das "províncias ultramarinas" em África, entre o final dos anos 1950 e 1974, e a condenação ao imobilismo das províncias na "metrópole". Os 250 kms de largura do rectângulo pareceriam talvez psicologicamente intransponíveis. As cidades do interior saltam particularmente os "anos 1960" e mantêm-se num limbo silencioso, melancólico, português suave para a eternidade.

A democracia e o poder autárquico romperam esse voto. Uma das histórias mais extraordinárias do sobressalto resultante é a dos Arquitectos Pioledo, em Vila Real, na década de 1980. É a história de uma democratização da arquitectura que antecede a inauguração das Amoreiras e o reconhecimento popular de Siza, numa conjugação futurista dos temas de Lisboa e da tradição do Porto. Os Pioledo projectaram e construíram dezenas de edifícios entendendo a arquitectura como um dispositivo ficcional e não meramente funcional. Tratava-se de imaginar Trás-os-Montes para lá dos atavismos e da fatalidade provinciana. António Belém Lima, regressado de Lisboa, era o ideólogo; mas a contribuição de cada um dos membros - Ricardo e Carlos Santelmo, Graça Campolargo, Albino Teixeira e Carlos Baptista - foi decisiva para a abordagem inclusiva, lúdica e culta do grupo.

Houve até um momento em que se podia dançar sobre a arquitectura. O Bar-Danças Favorita, inaugurado a 13 de Fevereiro de 1984, significava a morte da boîte e era um palácio art deco enterrado, com muita luz eléctrica e tinta plástica, onde se ouvia Associates, Orange Juice, The Smiths...

No trabalho do grupo, todos os simbolismos, eclectismos, decorativismos, construtivismos, eram disponibilizados. A controvérsia seguiu-se: Lisboa e Porto gostam, ao modo provinciano, que as coisas estejam no seu devido lugar e os Pioledo não estavam. Graças a José Monterroso Teixeira, houve no entanto uma exposição antológica no CCB, em 1994; e, depois, o silêncio. Entretanto, a Favorita tinha fechado. O tempo mostra-nos como esta aventura sem paralelo - colectiva, festiva, torrencial - foi premonitória da popularidade que a arquitectura iria ganhar. Mas a província não voltou a falar tão alto e tão vibrantemente. Os arquitectos envolvidos continuaram a fazer arquitectura e a ensinar; Belém Lima tem-se distinguido num percurso paralelo à "arquitectura portuguesa", mantendo a intensidade original mas acrescentando-lhe outra viabilidade construtiva e semântica.

Enquanto preparo a apresentação que irei fazer no Museu da Vila Velha, em Vila Real, impressiono-me ao relembrar a candura, optimismo e energia daquele período face ao corte de cabelo que hoje temos de usar.

Na província, é preciso sonhar mais alto que nas grandes cidades. Falarei do coração da província; onde é preciso ter um coração maior.


 
 
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Jorge Figueira



 
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