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02-04-2013        Público

Enquanto investigadores ligados às questões do trabalho, animados por um compromisso profundo, isento e de crítica construtiva para com o movimento sindical, sentimos a obrigação de tornar pública a nossa posição perante o recente anúncio da CGTP de promover uma iniciativa no âmbito das comemorações do centenário do nascimento de Álvaro Cunhal.

Não está, evidentemente, em causa a figura de Álvaro Cunhal nem o papel histórico que desempenhou, enquanto líder do PCP, na luta contra o fascismo e na definição do regime democrático após o 25 de Abril de 1974. Os eventos comemorativos do seu centenário são indiscutivelmente merecidos, pelo que é perfeitamente respeitável que dirigentes da CGTP, membros ou não do PCP, possam juntar-se às comemorações.

Porém, Álvaro Cunhal foi dirigente de um partido político e não da central sindical. O envolvimento institucional da confederação nestas comemorações prejudica o movimento sindical e a própria CGTP, visto que contribui para o seu afunilamento político e eventual perda de legitimidade. Será preciso lembrar que a CGTP é estatutariamente uma confederação sindical independente de partidos políticos? A iniciativa de homenagear Álvaro Cunhal fornece argumentos a quem há muito a acusa de ser um prolongamento da ação do PCP. Ou seja, esta iniciativa será um forte contributo para fragilizar ainda mais o campo sindical e a luta da classe trabalhadora, reforçando assim a confusão já instalada na opinião pública entre este partido e a central, de resto, contrariando a declaração de unidade e de pluralismo anunciada no seu último congresso.

Apesar de ter uma maioria de comunistas na sua liderança, a CGTP organiza trabalhadores que não são necessariamente simpatizantes do PCP e que certamente irão rejeitar uma identificação tão explícita da sua central com esse partido específico. Será possível que os promotores desta iniciativa não estejam conscientes do efeito que este gesto vai ter nas correntes não-comunistas da central e na opinião pública? Será a motivação ideológica tão poderosa que os impeça de perceber o erro que cometem? As consequências desta decisão far-se-ão refletir sem dúvida na imagem pública, na unidade da sua direção e, consequentemente, fragilizarão a CGTP.

O sindicalismo tem vindo a perder força um pouco por todo o lado e não apenas em Portugal, quer pela diminuição do número de filiados, quer pela quebra de confiança nas suas potencialidades. Ao mesmo tempo, o atual contexto de crise estimula o afastamento dos trabalhadores dos sindicatos por medo de retaliações e devido à perseguição de que os ativistas são vítimas no seio das empresas. Mas, apesar do baixo volume de filiação, a grande maioria dos assalariados reconhece que sem o sindicalismo as condições de trabalho seriam bem piores. E é justamente por essa razão que hoje, mais do que nunca, o movimento sindical português precisa de um novo impulso para estar à altura das difíceis circunstâncias em que nos encontramos e dos desafios que temos pela frente.

Num momento em que as lutas laborais e sociais se intensificam no nosso país face à maior ofensiva contra os seus direitos dos trabalhadores desde o 25 de Abril e em que estes mais precisam de estruturas organizativas capazes de potenciar o seu descontentamento e liderar a indignação de setores laborais e sociais diversos - nomeadamente com base na aliança entre grupos e movimentos de cidadãos mais distantes do mundo sindical mas que podem vir a contribuir para a sua renovação e revigoramento -, esta opção da direção da CGTP constitui, no nosso entendimento, um passo atrás na dinâmica e revitalização do sindicalismo português.

 


 
 
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Elísio Estanque
Hermes Augusto Costa



 
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