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29-03-2013        Diário de Notícias

Lembram-se do “partidos dos reformados”? Lembram-se do “partido dos contribuintes”? Lembram-se do “partido da lavoura”? Parece que foi há uma eternidade!

Convenhamos: a retórica do partido de defesa dos reformados nunca se confundiu com uma identidade de defesa do Estado Social – o CDS foi o campeão do ataque ao rendimento mínimo e nunca se coibiu de incendiar o senso comum com a narrativa (palavra na moda…) dos preguiçosos a viverem à custa do trabalho alheio. A retórica do partido de defesa dos velhinhos foi sempre uma cortina do partido do ataque aos jovens precários, um partido que sempre esteve na primeira linha da recusa do cumprimento da lei para pôr fim aos falsos recibos verdes. Sem surpresa, portanto, o partido dos reformados esfumou-se – o próprio ministro da área anda desaparecido em combate…  – e deu lugar ao partido do apoio aos cortes drásticos nas pensões seja através do orçamento, seja através de políticas avulsas.

Convenhamos: a retórica do partido de defesa dos contribuintes foi invariavelmente uma camuflagem habilidosa para o partido do ataque a tudo quanto ameaçasse os benefícios fiscais dos offshores. Não pode, por isso causar espanto que o mesmo partido que rasgou as vestes de indignação diante de subidas de impostos antes de entrar no Governo seja agora responsável pela mais arrasadora subida de impostos de que há memória na democracia portuguesa, incluindo os 23% de IVA para o setor da restauração, os reescalonamentos no IRS ou o fim de isenções ou deduções fiscais de forte impacto social.

Convenhamos, enfim: a retórica do partido da defesa dos agricultores sempre foi de mão dada com um apoio sem mácula a uma política de distribuição dos fundos da Política Agrícola Comum que favoreceu invariavelmente os grandes proprietários de terra, em regra sem atividade produtiva, em detrimento dos pequenos agricultores e da luta pela qualificação da pequena produção. Ninguém é, portanto, de admirar que o alegado partido da lavoura seja hoje responsável pelo definhamento da agricultura, com uma população cada vez mais envelhecida, indefesa e marginalizada.

Tudo isso o vento levou. E agora, que a receita da austeridade punitiva exibe o seu estrepitoso falhanço a cada dia que passa e que a vida das pessoas mergulha num inferno sem horizonte de mudança, o CDS vem ensaiar uma nova estratégia de disfarce. Agora querem que vejamos nele o partido da consciência crítica da austeridade. Há um pequeno senão: trata-se de um partido que apoia, uma a uma, todas as medidas de austeridade.

Essa consciência crítica é um rumor, não mais que um rumor. É uma coisa que consta e não mais que isso. Que se diz que há mas não se vê exatamente onde. O exemplo do salário mínimo é paradigmático: sucessivas notícias dão conta de que o CDS é a favor do aumento do salário mínimo, mas das três vezes que o parlamento decidiu sobre o assunto o CDS votou contra. O mesmo vale para o aumento de impostos: que não, que não pode ser, que se for preciso deitam o Governo abaixo, tudo em notícias de jornal, para no fim virem invocar a estabilidade, o interesse nacional e essas abstrações salvíficas para justificar que têm que vota a favor daquilo que supostamente estão contra.

Neste clima de fim de festa, correm nas redações narrativas (de novo uma cedência à moda) de grande discordância na coligação. Mas, tudo visto e revisto, a tal consciência crítica do CDS resume-se a uma surdina: “tirem o Relvas e o Álvaro para que o essencial fique e se reforce”. Consciência crítica é isto? Não, isto é manobra.

Dizem-no os reformados, dizem-no os contribuintes e di-lo a gente da lavoura. Di-lo o país, cansado de jogos florais enquanto tudo desaba na vida das pessoas.


 
 
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José Manuel Pureza