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18-01-2013        Diário de Notícias

O Estado assumiu como seus 5,5 mil milhões de euros de créditos do BPN. Desses, cerca de 2,2 mil milhões foram dados como definitivamente incobráveis e contabilizados nos défices de 2010 e 2011. Ou seja, passou de dívida de alguns para dívida de todos nós. E mais 3 mil milhões vão em breve ter o mesmo destino. Aos que defendem que toda a dívida deve ser paga cabe perguntar: esta também? Porquê?

Na dívida pública estão incluídos os 50 mil milhões de euros de encargos com as parcerias público-privado que agora são unanimemente consideradas como negócio ruinoso para o erário público. E a fatura da troika, que os contribuintes pagarão com juros muito superiores aos que os próprios bancos pagam para se financiarem junto das instituições europeias, inclui uma parcela de 12 000 milhões de euros para recapitalização do sector bancário. Também sobre estes milhões cabe perguntar a quem defende que toda a dívida pública deve ser paga por todos nós, gente honrada: esta também? Porquê?

De acordo com o Orçamento do Estado para 2013, o País - todos nós - pagará este ano em juros da dívida pública 8,8 mil milhões de euros que é cerca de 3,5 vezes o encargo da totalidade dos subsídios de desemprego e 25 vezes o esforço de pagamento da totalidade do rendimento social de inserção. Este montante podia ter sido substancialmente reduzido se o Governo tivesse visto na reestruturação da dívida grega uma oportunidade para aliviar o ónus que pesa sobre as nossas finanças públicas. O certo é que, onde havia uma oportunidade, o Governo viu uma ameaça de contágio de perceções. E os 8,8 mil milhões de juros aí estão. E lá volta a pergunta a fazer aos que defendem que dívida é dívida e tem de ser toda paga por todos nós: esta também? Porquê?

Pagar as dívidas próprias é certamente um imperativo de honestidade. Mas que eu me obrigue a pagar, em nome da minha honra própria, as dívidas contraídas por outro e que ele ardilosamente transferiu para mim é tonto. E, mais que tonto, é irresponsável se cortar direitos aos que comigo vivem ou de mim dependem. Mais ainda: é criminoso se se confirmar que era exatamente o empobrecimento de todos que o primeiro endividado realmente queria que acontecesse para que ele pudesse continuar a enriquecer.

A quem defende que toda a dívida deve ser paga por todos nós, vale a pena lembrar cinco anos de história. Lembrar--lhes como a vertigem irresponsável do sistema financeiro foi transformada por políticos concretos em dívidas soberanas dos Estados e, por essa via, em dívidas de todos nós. Lembrar-lhes que só no caso da União Europeia, as garantias dos Estados aos bancos em risco de falência atingiram mais de 40% do PIB da União. E lembrar-lhes que em nome da honra de quem não contraiu senão uma parte infinitesimal dessa dívida mas agora é suposto pagá-la toda, se diz ser imperativo destruir os Estados, destruir as sociedades e destruir as economias. É o crime perfeito.

Há uma resposta para esta estratégia ardilosa. Chama-se democracia. E não é por acaso que é a democracia, enquanto voz de todos, que está na mira deste projecto de imensa destruição social. A força da democracia é a limpidez da realidade proporcionada pelo seu conhecimento aberto e sólido. Conhecer que dívida é realmente a nossa, que ingredientes tem, que responsabilidades a geraram, que partes são de todos e que partes não o são, é uma exigência fundamental da democracia. Sem esse conhecimento, ficamos à mercê de estratégias ardilosas de passa-culpas e afundamo-nos como país para que os mesmos de sempre possam continuar a ter as vantagens de sempre. É por isso que uma auditoria à dívida é tão "inoportuna", tão "inviável", tão "despropositada". Para quem ganha com o nevoeiro, é assim a democracia.


 
 
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José Manuel Pureza



 
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