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30-09-2012        Público

Embora as lutas sindicais venham caminhando de recuo em recuo desde há décadas, a institucionalização do sindicalismo e o seu papel negocial nunca suplantou o clima de ressentimento e de medo que se vive no tecido empresarial português e que, hoje, em tempos de austeridade violenta, se estende a toda a sociedade.

A mobilização de ontem foi poderosa e demonstrou o potencial de consciência crítica que as estruturas sindicais ainda preservam. Mas tratou-se de uma luta eminentemente política, mais do que laboral. De resto, é a “sociedade civil organizada” que está a mostrar a sua força. Vivemos num momento em que a aproximação entre o campo sindical-laboral e o campo dos movimentos inorgânicos pode ocorrer de novo. Se no Maio de 68 francês se criou a expectativa de um possível (mas não consumado) encontro entre a luta económica (materialista) e a crítica expressiva e cultural (pós-materialista), e se no 25 de Abril português os novos e velhos movimentos (partidos e sindicatos) se misturaram, sob a hegemonia dos segundos, as manifestações que ocorreram ao longo do último ano voltaram a colocar lado a lado os movimentos sindicais tradicionais e os novos movimentos de indignados e precários – e o papel das redes informáticas –, deixando transparecer a divisão entre essas logicas de ação coletiva, mas ao mesmo tempo revelando a sua possível complementaridade numa situação de emergência.

Estabelecendo uma comparação entre as manifestações do passado dia 15 de setembro e a manifestação de ontem convocada pela CGTP-Intersindical, pode dizer-se que as primeiras exprimiram o descontentamento de uma muito mais ampla variedade de segmentos sociais, muito para além do mundo sindical e do universo da esquerda, enquanto que no Terreiro do Paço estiveram sobretudo os setores organizados e de esquerda. Há quinze dias prevaleceram os cartazes improvisados e imaginativos, feitos com cartão e materiais rudimentares, enquanto ontem foram as faixas aparatosas a toda a largura da rua, montadas nas sedes sindicais e onde pontificou o fundo vermelho. Se no 15 de setembro se sentiu acima de tudo a espontaneidade do povo numa rebelião cidadã, mas sem uma “agenda” clara, no caso da manifestação da CGTP houve toda uma orgânica de preparação e os objetivos políticos estão claramente formatados pela orientação ideológica definida por forças que se assumem como a “vanguarda” do povo, mas que não apresentam qualquer alternativa de governo.

Trate-se ou não da “maior de sempre” (de tão repetida esta afirmação, já se tornou trivial), esta manifestação pode ser o início de um novo ciclo de conflitualidade social nos tempos que se avizinham, caso se persista em ignorar os sentimentos do povo.


 
 
pessoas
Elísio Estanque



 
temas
CGTP    manifestações    sindicalismo