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24-06-2012        Público/Revista 2    [ pág. 12 ]

Um tema frequente na academia e em livros de auto-ajuda é a relação entre arte e arquitectura, o arquitecto e o artista. É como comparar um alfaiate com um pescador. Têm muito em comum, mas há diferenças insanáveis. É um jogo de mal-entendidos. Uma típica relação de amizade, portanto.

Quando os artistas entram no campo da arquitectura têm a sua própria agenda; quando os arquitectos entram no campo da arte têm a agenda dos artistas. E assim sucessivamente. As assimetrias superam qualquer cubismo analítico.

Praticamente todos os títulos de filmes de Hollywood expressam bem a situação: Atracção Fatal, O Pecado Mora ao Lado, Die Hard. Entre os artistas e os arquitectos, há sempre um concurso inteligente de estupidez como em The Big Lebowski entre The Dude e o personagem de John Goodman. Cruzamo-nos em escadas rolantes, um que sobe e o outro que desce, e durante esse breve momento fazemos sentido.
Teoricamente, os artistas criam problemas e os arquitectos resolvem. Na prática, o inverso é mais verdadeiro. Aparentemente, os artistas são diletantes e os arquitectos militantes mas com frequência é o contrário que acontece.

Não sabemos exactamente porque gostamos ou precisamos uns dos outros; não é que os artistas precisem; ou que os arquitectos gostem; mas lá está.

Para os arquitectos, os artistas são alguém que vai à frente, por sua conta e risco. Há cinco artistas por quem não me importo de ir à frente. A última vez que encontrei António Quadros começou a chover levemente mas ele não parou de falar. Em Maputo, onde ajudou a fundar a escola de arquitectura, as suas sebentas de estudo ainda circulam. Era um homem tão excepcional que não conseguimos encontrar o sítio onde começar a defendê-lo e a estudá-lo. Só a voz de Alberto Carneiro alarga o horizonte. Nas Belas-Artes do Porto dava ao acto de desenhar uma inteligência não puramente prática que enlouquecia a tradicional militância arquitectónica. Apresentava problemas por apresentar.

Mais à frente, lembro-me da amabilíssima companhia de Sebastião Resende, em viagem pela Holanda, atento à mecânica dos detalhes que nos esforçamos por enquadrar ou esquecer.
Ainda agora na Sala dos Capelos, em Coimbra, Pedro Pousada com pertinente persuasão a intersectar a arte e a arquitectura modernas. Ou em permanência no tecto da minha casa, António Olaio, cubista sintético em tudo menos na sua arte.

Tenho uma admiração particular pela obra destes cinco artistas. Mas gosto particularmente do modo como são pessoas diferentes e irrepetíveis entre si, totalmente opostas em tudo. Indo à frente, esticam a corda que nós prosaicamente queremos puxar. Tudo o resto são apenas belas hipóteses académicas. Ou literatura de auto-ajuda como esta.


 
 
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Jorge Figueira



 
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