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18-10-2006        Diário Económico
A nível europeu o Presidente da Comissão elegeu o MIT como modelo ao propor o European Institute of Technology (EIT) – a inspiração não podia ser mais explícita!

Foi recentemente assinado pelo Governo português, e justamente destacado pela imprensa, um acordo de parceria com o MIT, em áreas de engenharia e em gestão, com vista ao desenvolvimento de diversos programas de formação avançada e de investigação.

Independentemente de questões, relevantes, quanto ao modo como este processo foi conduzido e as áreas e parcerias identificadas, esta é sem dúvida uma iniciativa que se espera traga importantes contributos para o desenvolvimento da C&T portuguesa e de programas de formação avançada.

É importante no entanto que esta notícia não nos faça ‘descansar’. Continua a haver sérios motivos de preocupação quanto aos processos de inovação em Portugal. Ao contrário do que alguns títulos de jornais parecem fazer crer ("Mestrados e doutoramentos vão ter o mesmo valor de mercado que os da universidade norte-americana") esta parceria não torna instituições portuguesas emulações desta reputada universidade.

Mas não pretendo aqui deter-me neste acordo específico. Este acordo é também um exemplo dos grandes desafios que enfrentam as universidades europeias e não apenas as portuguesas. Também a nível europeu o Presidente da Comissão elegeu o MIT como modelo ao propor o European Institute of Technology (EIT) – a inspiração não podia ser mais explícita!

O sucesso científico das universidades norte-americanas, reflectido na recente atribuição dos Prémios Nobel da Medicina, Física, Química ou Economia na totalidade para investigadores dos EUA, e a enorme competitividade tecnológica da indústria norte-americana têm estado na base do debate político sobre a ciência e o ensino superior na Europa. Há, naturalmente, muitíssimo boas razões para isso. Mas há também importantes diferenças entre os EUA e a Europa que recomendam precaução na emulação institucional.

É importante que esses modelos não se imponham por defeito ou com base em análises que negligenciam o seu verdadeiro objecto, neste caso o contexto europeu. O domínio das universidades norte-americanas é muito mais lato do que um dado modelo institucional, como o MIT. Muitas vezes o discurso político tende a enfatizar o suposto "paradoxo europeu" – de que existe uma elevada qualidade científica na Europa mas uma débil exploração dos resultados (precisamente onde o MIT seria mais forte). Ora este pressuposto tem vindo a ser fortemente questionado por vários autores, que indicam também a existência de debilidades a nível da produção e organização científica e competitividade industrial. Ou seja, não se trata apenas de um problema de ‘transferência’ mas de uma questão estrutural.

Assim, soluções ‘top-down’, como a construção do EIT, negligenciam as dinâmicas evolutivas das instituições, e do seu contexto específico. O trabalho de Henry Etzkowitz demonstra o modo como o MIT evoluiu, em diversas fases, durante um longo período de tempo. A dinâmica e cultura do sistema, e não apenas da instituição, foram de particular importância.

É também importante reconhecer que o diluir da fronteira entre o conhecimento público e privado, e entre os objectivos de universidades e empresas, acarreta outros custos significativos, desde barreiras de acesso ao conhecimento público a questões de conflitos de interesses, sobre os quais é importante reflectir!

Se o sucesso das universidades norte-americanas, e da sua inserção no respectivo sistema de inovação, deve sem dúvida ser inspirador para a Europa, as suas congéneres europeias devem ser capazes de definir uma estratégia própria, coerente com a Agenda de Lisboa, articulando o modelo social e competitividade, e dinamizando uma mudança da cultura do sistema, mais do que apenas seguir os passos ditados pelo exterior.

Nota 1: Faz 40 anos que Chris Freeman fundou a Science Policy Research Unit (SPRU), da Universidade de Sussex. Este centro de investigação foi pioneiro na investigação sobre políticas de C&T e inovação e mantém-se como uma referência central nesta área, com inúmeras contribuições de referência ao longo dos anos. Cabe aqui esta nota de congratulação pelo trabalho desenvolvido. Mas nota-se aqui também o tempo que as ideias levam a consolidar-se na agenda e no discurso político, agora que finalmente a ênfase na importância da ciência e da inovação veio para ficar no discurso político.

Nota 2: Será que a ABIC (Associação dos Bolseiros de Investigação Científica) está atenta às implicações da reforma da segurança social para os bolseiros de investigação, que em muitos casos desenvolvem trabalho avançado de investigação durante 10 anos ou mais com contribuições para o sistema, se acaso o fizeram, ao nível do salário mínimo? Parece-me razão suficiente para repensar o Estatuto do Bolseiro para o futuro…



 
 
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Tiago Santos Pereira