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25-09-2005        Diário de Notícias
Nesta amostra do Portugal autárquico não se levanta a dicotomia entre Norte e Sul, centros urbanos e mundo rural, Grande Lisboa e o resto do País.

O culto mariano, "muito disseminado no Sul da Europa e que cala fundo no povo português", cria uma teia de solidariedades femininas que não pode ser menosprezada, acentua o sociólogo Fernando Ruivo. Não terá sido por acaso, acrescenta, que na primeira linha das recentes manifestações de apoio a Fátima Felgueiras estavam precisamente mulheres.
Os quatro casos mais emblemáticos destas eleições - embora arrumados no mesmo patamar devido ao facto dos seus protagonistas terem casos com a Justiça e afrontarem os partidos - têm, porém, "gradações diferentes". No entender de Fernando Ruivo, variam entre a figura de "salvadora" de Fátima Felgueiras e o "populismo mais moderno" de Isaltino Morais.
Nesta amostra do Portugal autárquico não se pode levantar a questão da dicotomia entre Norte e Sul (o historiador José Mattoso tem vindo a sustentar que, apesar da tentativa do Estado para a menorizar, de facto existe), nem entre os centros urbanos mais cosmopolitas e o mundo rural alegadamente mais retrógrado, sequer entre a macrocéfala Grande Lisboa e o resto do País (como agora divide o território, em termos de vantagens e mentalidades, por exemplo, Marcelo Rebelo de Sousa).
Afinal, um dos concelhos onde o fenómeno se apresenta é Oeiras, cujos indicadores de atracção das novas tecnologias ou a política cultural são de tal modo evidentes, reconhece Fernando Ruivo, que Isaltino de Morais até era, ainda há alguns anos, apontado como "autarca modelo" do PSD.
A publicitária Vera Nobre da Costa, analisando as candidaturas apenas numa perspectiva de eficácia da comunicação, rotula a candidata a Felgueiras de "brilhante". Além de demonstrar uma grande força interior, em que é capaz de transmitir uma imagem de simpatia sem se deixar emocionar com a sua situação, teve "um timing de chegada a Portugal que foi magistral", a que se seguiu uma campanha imediata eficiente, do modelo dos carros de som aos cartazes graficamente correctos.
O estilo de Valentim Loureiro, o ex-presidente do Boavista que se recandidata a Gondomar - arrastando com ele a estrutura do PSD local (como sucede, de resto, também no caso de Oeiras), como constata Fernando Ruivo -, é, na opinião da especialista em publicidade, "arruaceiro". Tem a seu favor, acrescenta Vera Nobre da Costa, "o futebol" e, em eleições anteriores, "a distribuição de electrodomésticos". E o politólogo António Costa Pinto, ao falar em tese sobre o populismo, dá o exemplo de certos políticos que, "em comunidades relativamente pobres da América Latina, surgem com ofertas gratuitas de refeições, de medicamentos ou de... frigoríficos".
A figura de Avelino Ferreira Torres, que troca o Marco de Canaveses por Amarante e não se apresenta agora ao eleitorado com o símbolo do "seu" CDS, até proporciona passeios de helicóptero às pessoas que nunca sonharam voar, conforme refere o director do Observatório dos Poderes Locais da Universidade Coimbra. Na sua análise puramente técnica, Vera Nobre da Costa considera que o seu "estilo é mais provinciano", pois foi capaz do "golpe de participar num programa televisivo [Quinta das Celebridades, na TVI] para conseguir maior popularidade", sendo, dos quatro, "o mais vulnerável em termos pessoais".
"Bonacheirão e extrovertido", uma espécie de "português médio", Isaltino Morais tem, na leitura da publicitária, um "estilo suburbano e ultrapassado". No entender da especialista em imagem e comunicação, apesar do "desastre dos cartazes" e do erro de recusar falar, nas entrevistas, sobre as verbas na Suíça que lhe afectaram a carreira política, pode eventualmente beneficiar "da memória que as pessoas têm da obra que fez" ao longo dos seus quatro mandatos.
Entretanto, nos outros 304 municípios, deve continuar a repetir-se o mesmo comportamento que verificaram, analisando o período e 1979 a 2001, Linda Gonçalves Veiga e Francisco José Veiga, do Núcleo de Investigação de Políticas Económicas da Universidade do Minho, e de que dariam conta no artigo Eleitoralismo nos Municípios Portugueses.
"Os resultados empíricos revelam claramente o comportamento eleitoralista dos autarcas que, em ano de eleições, aumentam os défices e as despesas municipais, fazendo crescer o emprego municipal", concluíram aqueles investigadores. Mas, com as atenções concentradas nos quatro mais mediáticos, o controlo desses comportamentos deverá ser esquecido.

 
 
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