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17-04-2016        Jornal de Notícias

Tudo indica que nos estamos aproximando do momento em que será posta à prova a possibilidade de conciliação das regras europeias – em particular as relativas ao Tratado Orçamental e à União Bancária – com programas políticos que interpretem efetivamente os interesses nacionais. O programa do atual governo, apesar de estruturado com todas as cautelas face àquelas regras, e de ensaiar somente pequenos passos na fuga às políticas de austeridade, vai ser posto em causa em matérias de grande significado para a vida dos portugueses.

Os poderes dominantes na União Europeia (UE) estão determinados em impedir países como o nosso de afirmarem a sua soberania, de utilizarem os recursos e capacidades próprias, e a mobilização e responsabilização dos seus cidadãos na construção de um modelo de desenvolvimento que, combatendo a pobreza, as desigualdades e a injustiça, possa ser rumo de futuro sem subjugação.

Há que gerir com coragem e dignidade as tensões que pairam no ar, seja na abordagem dos problemas económicos e financeiros, seja nos pronunciamentos políticos na UE, ou ainda no diálogo e relacionamento com todos os outros países.

Está cada vez mais claro que as políticas monetárias por si já não resolvem os problemas que bloqueiam o crescimento económico e o desenvolvimento. É preciso que os Orçamentos dos Estados tenham folgas que permitam aumentar o investimento. É isso que o próprio FMI vem reclamando, embora pareça pretender que essa opção valha para a Alemanha e outros com mais poder, mas já não se aplique a países que se encontram em dificuldades, por se depararem com brutais dívidas.

Para nós, o que está aí em força é a ladainha de que Portugal “está em situação difícil e precisa de mais medidas”, ou seja, de sacrifícios do povo. A pressão sobre a Grécia está de novo em alta. A diabolização do governo grego e o achincalhamento do seu povo prosseguem, visando forçar novos cortes em pensões e outros direitos sociais. Este processo é fortemente usado contra Portugal, contudo alguns dos nossos principais políticos da Direita fazem coro com os carrascos.

A situação política em Espanha permanece bloqueada, e os dirigentes da UE e do BCE continuam toda uma ação no sentido de limitar as hipóteses de o povo espanhol e as forças políticas progressistas encontrarem uma saída que não se submeta ao programa do Partido Popular Europeu e do poder económico e financeiro. Nesta estratégia, Portugal é colocado como “parte” da Espanha: provavelmente viremos a constatar que, silenciosamente, fomos integrados em opções de reorganização da Banca ou de áreas económicas, num processo Espanha/UE, que ignorou em absoluto os interesses específico de Portugal.

É neste complexo quadro que devem ser analisadas as medidas a ser adotadas na banca portuguesa. Tenhamos em conta: i) o governador do Banco de Portugal mais facilmente segue os interesses UE/BCE do que as posições dos órgãos de soberania ou do governo português; ii) nestes negócios a responsabilidade pública acaba sempre por gerar novas faturas cobradas aos cidadãos; iii) há entidades especializadas em chorudos negócios a partir da compra de créditos mal parados e de dívidas.

Qualquer plano de intervenção na Banca deve ser transparente e muito bem explicado nos seus objetivos e implicações. Não bastam as afirmações bondosas de que é para garantir financiamento às empresas, ou para “não injetar dinheiro público na banca”.

O Primeiro-ministro disse esta semana que a UE está num estado de “tempestade perfeita”. Não são ainda percetíveis nem o tempo que se segue, nem a dimensão dos estragos. Há, pois, que agir em plena tempestade: cuidando do que é nosso e assumindo as nossas responsabilidades; explorando convergências com todos os governos que não estão disponíveis para se submeterem ao “pensamento único” e às inevitabilidades até agora impostas, a partir essencialmente da Alemanha; preparando refletidamente soluções mais arriscadas ou ainda não experimentadas se a tal formos obrigados.

Deseja-se, também, que surjam menos entorses resultantes de comportamentos irrefletidos de Ministros, de Secretários de Estado, ou de outros atores do espaço da governação.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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