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27-12-2015        Jornal de Notícias

Este ano de 2015 que agora termina foi desavergonhadamente classificado de "ano de saída limpa", entretanto, na sua ponta final, está a propiciar-nos uma perceção mais clara das sujidades escondidas ao longo das últimas décadas e, em particular, durante a governação da Direita na anterior legislatura. Os crimes políticos (e outros) contra os direitos e superiores interesses dos portugueses foram muitos e de enorme dimensão.

A Direita tem consciência do que fez, por isso já se colocou em reformulação e está a criar as várias caras com que pretende dar eficácia à sua ação. No seu seio está entranhado um forte ressentimento face à solução política que o voto dos portugueses permitiu; então fica entregue ao CDS o papel de o exprimir, dado que ideologicamente a Direita não democrática se identifica naquele partido e ali não faltam quadros arrogantes, desavergonhados e sem pudor. Ao PSD ficam entregues as tarefas de representar uma Direita responsável que de novo quer ser dialogante, logo empenhada em recompor todos os mecanismos e compromissos do centrão de interesses, de que aliás também uma parte do Partido Socialista tanto gosta. Passos Coelho está em reciclagem e, porque pode ser-lhe atribuída forte responsabilidade pelo desastre e sofrimento em que o país e o povo foram colocados, já vai dizendo: "Espero que não façam demasiadas passa-culpas".

Sem espírito de vingança, mas com determinação e rigor, há que pôr a nu as charlatanices e maldades que nos têm sido impostas. A participação e responsabilização social e política das pessoas exige conhecimento objetivo da realidade em que se movem, dos perigos que trilham e das capacidades mobilizáveis para a construção "de projetos de vida e de felicidade", de que nos falou o primeiro-ministro na sua mensagem de Natal. O diálogo, a transparência e o compromisso de que os portugueses necessitam têm de partir destas premissas.

O Serviço Nacional de Saúde foi depauperado: surgem doenças e mortes em resultado dessa política. Sem alarmismos, há que assumir esses factos identificando bem os elos e as capacidades destruídas. Os recursos do país são escassos, os profissionais de saúde, que tão maltratados têm sido, vão ter de fazer sacrifícios para ajudarem à eliminação dos problemas mas, naturalmente, só o farão se houver verdade na responsabilização, se se sentirem parte da construção das políticas e se as promiscuidades de negócio entre o público e o privado forem desmanteladas. Os novos governantes não podem fazer abordagens redondas que diluem culpas.

Num tempo de premência de investimento produtivo, é dramático constatar-se que, em menos de uma década, o sistema bancário destruiu 40 mil milhões de euros. Grande parte da poupança de que agora tanto precisávamos foi distribuída aos acionistas em forma de "lucros", os gestores pagaram-se principescamente e outra parte do dinheiro evaporou-se em negociatas e atos de gestão irresponsável. O buraco do Banif ampliou-se em resultado de uma atuação politicamente oportunista de Passos, Portas, Maria Luís e Carlos Costa. A "saída limpa" de Portas e Passos foi camuflada pelo acumular de buracos no setor financeiro e nem o professor de finanças que mora em Belém quis topar a coisa. Os seus amigos da troica e do poder instituído na União Europeia deram cobertura a este caminho, porque estão em funcionamento mecanismos que colocam, sem apelo nem agravo, o povo a pagar as faturas.

Cavaco Silva, na escalada do disparate que vem preenchendo o seu discurso, afirmou que "Em matéria de governação, a realidade acaba sempre por derrotar a ideologia". Este grande "malandro" da política - está no combate ideológico e político há 40 anos e faz de conta que é um tecnocrata sem ideologia - chama realidade ao conjunto de estruturas, práticas e regras neoliberais criadas por quem pensa como ele, e coloca como irreais os valores da democracia, da soberania e da dignidade humana.

O discurso das reestruturações e reformas tem se ser substituído, em parte significativa, pela ação política de reabilitação das estruturas e infraestruturas humanas que organizam e gerem o setor público e privado.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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